Depois que o Supremo Tribunal Federal declarou em 2020 que as contribuições sociais a terceiros são constitucionais, ganhou relevância outra discussão que existe pelo menos desde 2008: a limitação das contribuições sociais a terceiros a até 20 (vinte) salários-mínimos sobre a folha de pagamento das empresas.
O debate gira em torno da vigência, ou não, do parágrafo único do artigo 4º da Lei 6950/81, que prevê:
Art. 4º – O limite máximo do salário-de-contribuição, previsto no art. 5º da Lei 6.332, de 18 de maio de 1976, é fixado em valor correspondente a 20 (vinte) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
Parágrafo único – O limite a que se refere o presente artigo aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.
Acontece que cinco anos após essa lei, foi publicado o Decreto-lei 2318/86 que no artigo 3º estabeleceu:
Art. 3º Para efeito do cálculo da contribuição da empresa para a previdência social, o salário de contribuição não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo, imposto pelo artigo 4º da Lei n. 6.950, de 4 de novembro de 1981.
Nota-se que não houve expressa revogação do caput do art. 4º da Lei 6950/81. Surgiu apenas um novo comando normativo dizendo que o cálculo da contribuição da empresa para a Previdência Social não estaria sujeito ao limite anteriormente estabelecido.
Apesar disso, o fisco sustenta que esse artigo 3º do Decreto-lei 2318/86 revogou o caput do artigo 4º da Lei 6950/81 e, como consequência, o respectivo parágrafo único teria perdido vigência.
Contudo, esse argumento da Fazenda Nacional é forçoso e tem poucas chances de prosperar. A simples leitura dos textos mostra que não houve revogação, nem tácita, muito menos expressa, e que o artigo 3º do Dec.Lei 2318/86 apenas alterou o comando normativo para excluir o limite de 20 salários-mínimos apenas para a contribuição previdenciária das empresas. Presumir, por meio de uma interpretação forçada, que houve revogação de uma garantia legal em favor das empresas, é algo absurdo.
Por esse e outros motivos é que o STJ, por meio de suas duas turmas de direito público, já decidiu favorável à limitação dos 20 salários-mínimos, entendendo pela plena vigência do artigo 4º da Lei 6940/81.
Acontece que por conta de algumas decisões que julgaram parcialmente favoravelmente ao fisco, tornou-se necessário pacificar o assunto por meio de julgamento pela sistemática dos recursos repetitivos. Ainda não foi marcada a data para esse julgamento, mas a expectativa é que o STJ confirme seu posicionamento, pois não há qualquer novo fato ou elemento que justifique mudança de posicionamento dos excelentíssimos ministros.
A DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL DEVIDA A TERCEIROS. LIMITE DE VINTE SALÁRIOS MÍNIMOS. ART. 4º DA LEI 6.950/1981 NÃO REVOGADO PELO ART. 3O DO DL 2.318/1986. INAPLICABILIDADE DO ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DA FAZENDA NACIONAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Com a entrada em vigor da Lei 6.950/1981, unificou-se a base contributiva das empresas para a Previdência Social e das contribuições parafiscais por conta de terceiros, estabelecendo, em seu art. 4o., o limite de 20 salários-mínimos para base de cálculo.
Sobreveio o Decreto 2.318/1986, que, em seu art. 3o., alterou esse limite da base contributiva apenas para a Previdência Social, restando mantido em relação às contribuições parafiscais.
2. Ou seja, no que diz respeito às demais contribuições com função parafiscal, fica mantido o limite estabelecido pelo artigo 4o., da Lei no 6.950/1981, e seu parágrafo, já que o Decreto-Lei 2.318/1986 dispunha apenas sobre fontes de custeio da Previdência Social, não havendo como estender a supressão daquele limite também para a base a ser utilizada para o cálculo da contribuição ao INCRA e ao salário-educação.
3. Sobre o tema, a Primeira Turma desta Corte Superior já se posicional no sentido de que a base de cálculo das contribuições parafiscais recolhidas por conta de terceiros fica restrita ao limite máximo de 20 salários-mínimos, nos termos do parágrafo único do art. 4o. da Lei 6.950/1981, o qual não foi revogado pelo art. 3o.
do DL 2.318/1986, que disciplina as contribuições sociais devidas pelo empregador diretamente à Previdência Social. Precedente: REsp.
953.742/SC, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJe 10.3.2008.
4. Na hipótese dos autos, não tem aplicação, na fixação da verba honorária, os parâmetros estabelecidos no art. 85 do Código Fux, pois a legislação aplicável para a estipulação dos honorários advocatícios será definida pela data da sentença ou do acórdão que fixou a condenação, devendo ser observada a norma adjetiva vigente no momento de sua publicação.
5. Agravo Interno da FAZENDA NACIONAL a que se nega provimento.
(AgInt no REsp n. 1.570.980/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 17/2/2020, DJe de 3/3/2020.)
Como já descrito acima, essa é a posição atual do STJ. Contudo, em decorrência de decisões de alguns Tribunais Regionais Federais que entendiam pela revogação do limite de vinte salários-mínimos para as contribuições a terceiros, o assunto será julgado na modalidade dos recursos repetitivos, estando cadastrado como Tema 1079, e a decisão deverá ser seguida em todos os demais processos.
O assunto assim foi registrado pelo STJ:
Questão submetida a julgamento:
Definir se o limite de 20 (vinte) salários-mínimos é aplicável à apuração da base de cálculo de “contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros”, nos termos do art. 4º da Lei n. 6.950/1981, com as alterações promovidas em seu texto pelos arts. 1º e 3º do Decreto-Lei n. 2.318/1986.
Então, diante dos precedentes e da força do direito em questão, a expectativa é que o Superior Tribunal de Justiça mantenha seu posicionamento.
POSSÍVEIS BENEFICIÁRIOS
Todas as empresas que possuem folha de salário superior a 20 salários-mínimos mensais podem ingressar com essa ação, buscando não apenas a suspensão do pagamento mensal, como também a restituição do que foi pago nos últimos cinco anos.
É SEGURO ENTRAR COM ESSA AÇÃO?
Como já explicado, existem precedentes favoráveis do STJ, em que pese alguns tribunais regionais julgarem em sentido contrário.
Então, diante disso, a empresa contribuinte tem algumas opções:
– ingressar com mandado de segurança buscando liminar para deixar de pagar ou então para depositar em juízo os valores. Para isso, vai depender do Tribunal Regional no qual será impetrada a ação, uma vez que alguns possuem entendimento contrário ao STJ, por isso inclusive que o assunto será pacificado com o julgamento do recurso repetitivo;
– ingressar com mandado de segurança (ou ação ordinária, se preferir), sem focar na liminar, buscando apenas o reconhecimento do direito ao final do processo. Esse é o caminho mais cauteloso e tem a valiosa vantagem de interromper a prescrição;
– aguardar o julgamento do recurso repetitivo. Se ele for favorável, então poderá fazer a recuperação administrativa ou judicial, a depender de como será a decisão. O problema nesse caso é que se esse julgamento demorar, o contribuinte terá perdido dinheiro, por conta da prescrição.
QUAL A VANTAGEM DE ENTRAR AGORA COM A AÇÃO?
Não sabemos quando será julgado o recurso repetitivo no STJ. Pode ser em 2023 ou em 2026, por exemplo. Porém, se o contribuinte deixar para judicializar somente após esse julgamento, caso ele seja favorável, terá perdido bastante dinheiro.
Isso porque, quando ingressa com a ação judicial torna-se possível receber os últimos cinco anos, bem como o período em que tramitou o processo e ainda deixa de pagar no futuro.
Assim, por exemplo, se o contribuinte ingressar com essa ação em 2023, poderá receber os retroativos desde 2018. Se o recurso repetitivo for julgado em 2027, então receberá a devolução dos valores pagos a mais desde 2018 até 2027.
Isso foi um fator bastante relevante, por exemplo, nos casos da PIS/COFINS. As empresas que ingressaram com ação para interromper a prescrição tiveram grande vantagem financeira.