Prática comum nas atividades empresariais é a bonificação com produtos, que consiste em o fornecedor enviar uma quantidade a mais de produtos, na forma de desconto incondicional, tornando, com isso, suas mercadorias e operações mais atrativas, além de valorizar o parceiro comercial.
O Ministro Humberto Martins, do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.111.156-SP, assim definiu essa rotina:
A bonificação é uma modalidade de desconto que consiste na entrega de uma maior quantidade de produto vendido em vez de conceder uma redução no valor da venda. Dessa forma, o provador das mercadorias é beneficiado com a redução do preço médio de cada produto, mas sem que isso implique redução do preço do negócio.
O que alguns empresários não sabem, é que os produtos enviados em bonificação não precisam ser tributados com o ICMS, podendo ingressar com medida judicial para evitar esses pagamentos e ainda ser restituído de tudo que erroneamente foi pago nos últimos cinco anos.
A Lei Kandir (Lei Complementar 87/96) estabelece no inciso I do art. 13 da LC 87/96 que a base de cálculo do ICMS, na saída de mercadoria, “o valor da operação”. Além disso, na alínea “a”, inciso II, parágrafo 1º, do artigo 13, dispõe que faz parte da base de cálculo do ICMS os “descontos concedidos sob condição”. E isso leva à interpretação de que, em sentido contrário, os denominados “descontos incondicionais” não devem compor a base de cálculo desse tributo.
Entretanto, os fiscos estaduais não entendem assim e insistem em tributar as bonificações justificando, entre outros argumentos, que não configuram como “descontos incondicionais”, sendo necessário ao contribuinte ingressar com medida judicial visando afastar a ilegalidade dessa taxação.
Contudo, no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o assunto está pacificado com a Súmula 457, da seguinte forma: “Os descontos incondicionais nas operações mercantis não se incluem na base de cálculo do ICMS.”. Nos tribunais de justiças estaduais esse entendimento é uníssono:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ
APELAÇÃO CÍVEL. ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributário. incidência de ICMS sobre mercadorias dadas em bonificação. equiparação aos descontos incondicionais. impossibilidade de inclusão na base de cálculo do imposto. súmula n. 457 – resp n. 1.111.156/sp. juros e correção monetária. TAXA SELIC PREVISTA NA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA, APLICÁVEL À REPETIÇÃO DE INDÉBITO. recurso de apelação provido. (TJPR – 1ª Câmara Cível – 0013289-57.2016.8.16.0021 – Cascavel – Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU FERNANDO CESAR ZENI – J. 13.02.2023)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
Repetição de indébito – Ilegitimidade ativa – Não caracterização – Inaplicabilidade do disposto no art. 166 do CTN, na pretensão de repetição de indébito de ICMS sobre mercadorias dadas em bonificação, pois não há contraprestação financeira nessa espécie de operação que possa fazer constar o repasse da exação – Mercadorias dadas em bonificação que não integram base de cálculo do ICMS – Modalidade de desconto que consiste na entrega de uma maior quantidade de produto vendido em vez de conceder redução do valor da venda – Possibilidade de restituição dos valores pagos indevidamente, nos casos de operações com mercadorias dadas em bonificação, em regime próprio – Precedentes deste Tribunal – Honorários fixados de acordo com o § 3º do art. 85 do CPC – Recurso provido. (TJSP; Apelação Cível 1071162-15.2019.8.26.0053; Relator (a): José Luiz Gavião de Almeida; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 5ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 30/11/2021; Data de Registro: 03/12/2021)
Vale ressalvar, que essa possibilidade de exclusão não está pacificada para os casos de ICMS em regime de substituição tributária (ICMS-ST). Ou seja, a jurisprudência é pacífica pela exclusão do ICMS sobre as bonificações apenas para as mercadorias em regime próprio de pagamento.
Além disso, é preciso muito cuidado quanto a forma de comprovar que as remessas de mercadorias em bonificação de fato são incondicionais e fazem parte, ou estão atreladas, a operações de venda. Em diversos casos, surge a necessidade até mesmo de perícia judicial contábil para isso, motivo pelo qual o Mandado de Segurança nem sempre é o caminho mais seguro.